21/09/2009

Asa ferida

Fugia do que não podia controlar. Fugia magoado com a dor de se sentir inseguro, perdendo-se na fronteira entre a verdade e o medo dela.
Tivera uma efémera felicidade que ainda lhe corria nas veias, lhe percorria as artérias, lhe inundava o cérebro, ao mesmo tempo que se transformava num regato de solidão. “Os lugares dos outros atingem-nos na nossa insegurança!” – Era o pensamento que o levava a um lago parado: um lugar que não estava vago, que era habitado por cisnes brancos, onde não cabia um patinho feio.
Contudo, não conseguia evitar de a imaginar no voo das gaivotas. As gaivotas e os sonhos possuem a liberdade de voar por entre as nuvens, indiferentes à agrura da viagem, apenas sentindo o odor a maresia no arco-íris que perseguem. O voo das gaivotas é sustentado pelas asas; são elas a segurança do voo no sopro do vento.
Mas nem ele era uma gaivota nem as suas asas lhe permitiam voar. Era um patinho feio de asa ferida, que tinha sido atingida na sua ainda débil segurança. Não, não podia aventurar-se no voo - as suas asas mal lhe amparavam a fuga.
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(A frase que se encontra entre aspas foi deixada em comentário pelo 'Antonio - o implume' no post 'Fuga', do separador 'Folhas esparsas'. Obrigada, António, pelo contributo que assim deste na continuação da história.)

19 comentários:

Justine disse...

É dura a constatação dos nossos limites - que tu desenhas com palavras tão poéticas!

antonio ganhão disse...

Falta aos sonhos o sentido de orientação das gaivotas!

Fá menor disse...

Oh, António!... que mau!... tu e as tuas frases!
Mas têm em comum a beleza do voo!



Justine,
sim, é duro... mas não podemos deixar de sonhar os nossos sonhos.

Jorge Freitas Soares disse...

Até os patinhos feios tem direito a sonhar.. é isso que faz deles cisnes.. mais tarde ou mais cedo.

Jorge

Fá menor disse...

Oh, Jorge, obrigada!
Haja alguém que me entenda!

Å®t Øf £övë disse...

Fá,
Quem é que na sua vida nunca se sentiu um patinho feio cheio de vontade de voar, mas sem forças para tal???
Bjs.

Fá menor disse...

Å®t Øf £övë,
ui! e então qualquer montinho de areia nos parece intransponível...
Bjs

Vicktor Reis disse...

Querida Fa

Os patinhos feios contém em si uma beleza ímpar que somente os eleitos têm capacidade de ver...

Quando a sociedade não der importância ao preço mas sim ao valor os patinhos feios voarão com tamanha beleza que todos ficaremos extasiados.

Beijinhos.

Sara disse...

Que texto bonito. Fez-me voar o pensamento para bem longe e tendo como companhia a doçura das gaivotas e a brisa do vento.

Fá menor disse...

Vicktor,
infelizmente, há valores escondidos que não se libertam porque estarem com patinhos feios...
nem todos têm a mesma sorte de nascerem cisnes já feitos.
Beijinhos.


Sara,
Obrigada. É bom sentir essa brisa nas gaivotas dos nossos sonhos...
mas não esquecer de pousar também na praia.
Bjinhs

Isabel José António disse...

Querida Amiga Fa menor,

Parabéns pelo belo texto. Infelizmente assim é, muitas vezes, na vida.

Mas a novidade é que, sendo patinho feio ou tendo as asas partidas, só temos uma hipótese que é superarmos essas dificuldades, porque a vida é sempre para a frente. Não se costuma tropeçar às "arrecuas".

As diversas dificuldades que nos aparecem na vida são para as ultrapassarmos e não deixar que elas nos derrubem ou impeçam a realização dos sonhos.

Beijinhos.

José António

Nuno G. disse...

Tão lindo… inspirador!
(www.minha-gaveta.blogspot.com)

Unknown disse...

É uma história que se adapta, atrevo-me a dizer a todos nós em alguns momentos das nossas vidas.

Beijinhos,
Ana Martins

Fá menor disse...

José António,
Muito obrigada. Sim, que não deixemos nunca as dificuldades nos derrubarem! há que superá-las!
Beijinhos


Nuno,
Obrigada :)


Ana,
pois também acho.
Beijinhos

Alberto Oliveira disse...

... às vezes apetece: fugir a sete pés da insegurança que lentamente nos vai rodeando,do aumento do custo de vida, do amor que nos escapa por entre os dedos, atravessando (com ou sem asas) a fronteira para o desconhecido(?!)Mas depois pensamos: e se nos vamos meter num cenário ainda pior? E lá esperamos que no próximo aniversário nos ofereçam umas asas fiáveis ou um voo até às Canárias...

Daniel disse...

"Eis que surge a insegurança, aquela que me maltrata, sempre cospe na minha cara. Eu não aguento mais. Mas a guerra eu não perdi."

Essa sua postagem me lembrou de uma música minha composta uns anos atrás sobre o tema.

Aliás, muitos devem sofrer disso.

Beijo

Utilia Ferrão disse...

Obrigada pela vizita ao meu cantinho.
Quanto ao patinho feio e ainda por cima com a asa derrubada, fico triste.

Mas falamos de Esperança.

Enquanto que os que têm asas voam,os outros fazem umas caminhadinhas a pé e deste modo também se aproximam mais dos objectos, das pessoas, porque... que eu saiba elas ainda não têm asas.
Há coisas pequeninas que não passam despercebidas aos patinhos feios..
No mundo em que vivemos há lugar para todos.
Grande abraço meu

pin gente disse...

sem que o saiba explicar, fizeste-me voar para uma música do rui veloso... "de que adianta saber as marés..."

não conheço o destino ou o trajecto do voo.
não sei o que está para além do primeiro passo.
que importa?!
será a foram de não hesitar ou voltar atrás na pasada. será a forma de não disparar até ao horizonte e perder a paisagem. será a forma de me ter num todo... ou num qua-se to-do.
pelos vistos im-por-ta!
importa... para que possa iniciar a esta longa e subtil viagem.

um beijo meu, fá.

Fá menor disse...

Legivel,
os nossos voos não podem estar dependentes de terceiros.
Nós é que temos de colar a nossas asas.


Daniel,
que se percam batalhas mas não 'a guerra'.
Beijo


DE MÂOS DADAS,
sim, quando não se pode voar mais alto caminha-se enquanto as pernas tiverem forças.
Abraço


Pin,
é certo: também temos de confiar de que os caminhos que percorremos nem todos são em vão. mesmo sem tudo conhecer. mesmo com inseguranças. mesmo sem saber se é aquela a maré.
beijo, amiga.

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