08/07/2011

Voo de Peneireiro


José Miguel sentou-se na esplanada do café e perdeu os olhos, por entre as copas das árvores, num ponto fixo no horizonte. Um ponto que era apenas um nome: Luísa.
Esse nome martelava-lhe no pensamento com insistência e corroía-o em ânsias obsessivas. Tentara libertar-se, mas era como se estivesse numa praia depois de ser vomitado pelo mar e, ao mesmo tempo, desejando esse sal que o cuspira.
Como é que se deixara naufragar naquelas águas? A tempestade, que até parecera que amainara, afinal, tinha regredido e virara-lhe o barco antes que ele tivesse tempo de chegar a um qualquer porto.
Respirava. Pelo menos respirava depois de dar à costa. Estava vivo. Tomar consciência disso era um alívio, mas também sofrimento. Quando é que voltaria a respirar sem aquela dor no peito? Se calhar estava na hora de tirar férias, de sair de Coimbra por uns tempos. Talvez fazer uma viagem, conhecer outros lugares, outras pessoas. Tirar a vista desse ponto do horizonte, tão perto e, ao mesmo tempo, tão longe.
Mas ali se mantinha a pairar, tentando equilibrar-se, de olhos fitos no sustento da sua felicidade, qual voo de peneireiro, que se sustém parado no ar com um bater agitado de asas, na mira do seu alimento. Contudo, nem se decidia a descer à terra, no voo picado necessário à sua sobrevivência, nem a voar para longe.

19 comentários:

  1. O peneireiro só desce à terra na hora certa, mas possivelmente não lhe dói o peito até chegar o momento...
    Um belo texto, Fa!

    Beijo :)

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  2. Olá, Fa

    Este seu texto é muito belo, duma pureza que ronda a própria poesia.Tempestade da alma, ânsias do coração, um amor sofrido, talvez, saudade de alguém inacessível...Uma história de amor que, pelo menos, uma vez na vida nos deveria bater à porta...

    Beijos

    Olinda

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  3. Somos movidos por nossos maiores interesses na vida e vamos nos guiando por eles.
    Bonito!
    Boa noite!
    Carla

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  4. Um voo a pairar no ar
    com uma decisão a tomar...
    será que fica como espectador
    ou desce e torna-se actor!?
    A vida a rondar
    as várias formas de estar...

    um bom fim de semana
    beijinho menina musical

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  5. Amiga Fá,

    Uma bela prosa em voo poético que muito apreciei.

    Os meus parabéns.
    Desejo-lhe um domingo feliz.
    Beijinhos,
    Ailime

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  6. Os pontos presos no infinito deviam de ser como as estrelas, inspiradores mas sem nome.

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  7. Voamos com os nossos pensamentos incontroláveis...
    Beijo d'anjo

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  8. Muitas vezes, assim acontece: um nome encerra todo o mundo, e detém o nosso vôo. :) Boa semana, amiga!

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  9. Que bom poder voar sempre com nossos pensamentos.Parabéns por essa prosa poética linda. Um beijo e ótimo começo de semana.

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  10. Voo indeciso não é voo...
    Belo texto, gostei.
    Beijo, querida amiga Fa.

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  11. Tudo tem seu tempo...
    Beijo Lisette.

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  12. Mais um lindíssimo e enternecedor texto cheio de Poesia e de Amor!

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  13. Um texto muito bonito
    O paralelo com o peneireiro apenas diz respeito ao olhar atento para lá dos pontos comuns.
    Sempre que o peneireiro avista a presa e a pode filar, pica sobre ela e não lhe dá hipótese de fugir.
    O personagem no texto andava apenas nos sonhos e lembranças de tempestade
    Parece que não se arriscou a nada.

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  14. Belo texto
    Um beijo amiga

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  15. Gostei desta tua poesia em prosa!
    Bjo

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  16. O pior é não conseguirmos viajar para fora de nós mesmos.
    Beijo.

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  17. Com certeza o rapaz estava apaixonado e muito provavelmente ela não gostava dele e por isso ele pensava tanto nela. Um abraço!!

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  18. Voar, parar no ar, decidir-se se pousa ou não. A natureza sempre nos traz lições fantásticas, mas dificilmente as seguimos.
    Muito legal mesmo, Fa!
    Adoro tudo que escreves!
    Uma semana bonita e tranquila...

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  19. (¯`v´¯)
    `·.¸.·´
    ☻/
    /▌
    ~'
    Feliz dia do amigo!
    Carla

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Truman Capote diz:
«Quando se trata de escrever,
acredito mais na tesoura do que na caneta.»...
Mas eu escrevo aqui por entre o imaginado e o sentido; e
«Entre meus rabiscos e minhas ideias há um mundo de sentimentos.» (Marcelle Melo)
.
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