Ainda meio fechada num casulo, recém-repatriada de um país envolto em vapor, qual nefelibata votada ao ostracismo, sou chamada à realidade pela professora.
A dona Conceição enceta uma conversa que, a mim, me irá fazer enfrentar algum inferno ainda pendente. Esta propõe aos alunos das duas classes, terceira e quarta, que façam uma redacção sobre uma possível futura profissão, igual para todos. Médico(a). Pressupondo que virá a ser esta a nossa profissão, é sobre ela que vamos ter que escrever, como trabalho para casa.
Chegada a casa, tranco-me no quarto e começo a dar largas à fantasia, colocando-me na pele de uma médica e percorrendo mentalmente espaços que se me tornaram familiares, moldando-os a mim com uma nesga de ilusão.
Se eu fosse médica teria um consultório, bem montado, com todos os medicamentos para tratar os meus doentes. Tratá-los-ia, a todos, com deveres de uma boa médica…
Suspendo a escrita. As lágrimas afloram e temo inundar a folha branca ao verter o meu pranto. É que as minhas cicatrizes não são algo subjectivo ou variável. Estão bem visíveis. São marcas indeléveis que me deformam o rosto, depois das feridas fechadas.
Com um breve movimento de cabeça, tento sacudir estas sombras que se projectam sobre mim em queda vertical. Se eu, um dia, viesse a ser médica, quem sabe, conseguiria curar-me a mim própria, removendo estas cicatrizes que me amargam na carne e na alma…
É sobre isso que vou ter que escrever, pois vou sofrendo os meus dias na expectativa de recuperar completamente, de que todas as marcas se desfaçam como a escuridão ao ser trespassada por um luar radioso.
Uma página de Memória AladaA dona Conceição enceta uma conversa que, a mim, me irá fazer enfrentar algum inferno ainda pendente. Esta propõe aos alunos das duas classes, terceira e quarta, que façam uma redacção sobre uma possível futura profissão, igual para todos. Médico(a). Pressupondo que virá a ser esta a nossa profissão, é sobre ela que vamos ter que escrever, como trabalho para casa.
Chegada a casa, tranco-me no quarto e começo a dar largas à fantasia, colocando-me na pele de uma médica e percorrendo mentalmente espaços que se me tornaram familiares, moldando-os a mim com uma nesga de ilusão.
Se eu fosse médica teria um consultório, bem montado, com todos os medicamentos para tratar os meus doentes. Tratá-los-ia, a todos, com deveres de uma boa médica…
Suspendo a escrita. As lágrimas afloram e temo inundar a folha branca ao verter o meu pranto. É que as minhas cicatrizes não são algo subjectivo ou variável. Estão bem visíveis. São marcas indeléveis que me deformam o rosto, depois das feridas fechadas.
Com um breve movimento de cabeça, tento sacudir estas sombras que se projectam sobre mim em queda vertical. Se eu, um dia, viesse a ser médica, quem sabe, conseguiria curar-me a mim própria, removendo estas cicatrizes que me amargam na carne e na alma…
É sobre isso que vou ter que escrever, pois vou sofrendo os meus dias na expectativa de recuperar completamente, de que todas as marcas se desfaçam como a escuridão ao ser trespassada por um luar radioso.
[Texto enviado ao 5.º Jogo das 12 Palavras - Texto IX]
15 comentários:
Fá,
mais um texto que adorei! Esta história que está a desvendar aos poucos merece um romance. Além disso, eu quero saber o percurso que a nossa heroína vai seguir. :P
Beijinhos
Por vezes, existem palavras,escritas ou ditas, que amarguram o coração,por mais que se sonhe, é preciso cultivar a força interior
beijos
Se já habita as nuvens, não se sinta condenada ao ostracismo. Toque a cerúlea ogiva e fure, como pégaso, algum manancial celeste. Se bem que acho que você já o fez, pois a Fonte de Hipocrene anda a banhar este blog. Beijos inspirados
O teu romance progride, coerente e equilibrado.Muito bem escrito!
Um belo texto. Gostei muito quando o li no conjunto. Gosto talvez até mais aqui. Muito bem escrito.**
... Uma heroina muito especial!
Estão lindos estes retalhos...
Beijinhos!
Retalhos da vida de um médico neste caso de uma musica? estou a gostar e nesta parte não sei ainda se sei porquê, ou se ando longe da verdade mas fiquei arrepiada com as frases escritas...
Acho que já é um luar radioso não precisa estar mais iluminada...
Beijinhos e seguirei a sua história, todos temos uma história infelizmente umas mas tristes mas seguimos com fé e esperança que ela mude e tenha um final feliz!!!
Obrigada pela visita e elogio, como costumo dizer: pinto com o coração , apenas isso.
LuisaB
É maravilhoso ler um texto tão sensível com um vocabulário tão rico de palavras.
beijos
Olá amiga querida!
Seu texto é surpreendente!
Escreve muito bem.
Parabéns!
Beijinho.
Uma história que me parece ter um encadeamento, apesar de imprevisível
Gostei
😊
Um texto de pura sensibilidade... que se calhar faltou um pouco à Dona Conceição... ao forçar uma redacção sobre uma profissão única...
Uma história aparentemente simples, de uma profundidade absolutamente incrível! Adorei ler! Beijinhos
Ana
Bella historia hay veces que uno solo espera ese cachito de inspiración y esperanza para seguir.Te mando un beso
Fa, adorei te ler.
Tenho pra mim que um médico de verdade cura não só o corpo mas a alma.
Muitas vezes o problema não está no corpo... e é preciso ter
sensibilidade pra cuidar dos pacientes com humanidade.
Ane
De Outro Mundo
🌺😘
Mais um texto incrível, Fá! Bjs e boa semana.
Las cicatrices no son tan buenas como a algunos lo parecen..
Enviar um comentário