10/06/2024

Sombras I

O tempo convidava a um mergulho naquela água reluzente. Mas o calor escaldante que se fazia sentir desenhava-se numa capicua de sofrimento. Caminhando pela beirinha da piscina, puxando pela mão o seu irmãozinho que ainda mal andava, o menino procurava desesperadamente com o olhar. No bolso, a chave de casa - uma mansão antiga, grande demais para dois meninos sozinhos. O pequenino chorava, ora caindo, não conseguindo acompanhar o passo agitado do irmão, ora sendo arrastado e obrigado, pelo mais velho, a levantar-se. A criançada ficou curiosa perante o espectáculo, e alguns adultos pareciam temer que os dois pequenos caíssem à água. Que se passaria com estes meninos que destoavam daquele ambiente? Infrutíferas buscas causavam cada vez mais desânimo neste menino de olhar cansado e fugidio. Havia já duas noites e dois dias em que tudo se resumia a uma espiral de angústia devastadora. Não a encontrava nos locais de lazer, que tão bem conhecia, habituado que estava a que ela os lá levasse. Procurara-a e não a encontrara. Urgia, agora, repensar a estratégia, antes que o desalento e o pânico se instalassem por completo. Sentado na soleira da porta da igreja, esperava. Talvez uma luz divina o iluminasse. Então pareceu-lhe que um anjo lhes falhava. Respondeu às suas perguntas como se o céu os tivesse vindo socorrer. Tinha necessidade de confiar em alguém. Contou tudo. O que acontecera, as suas inquietações, os seus medos e o como já não sabia mais que fazer para calar o irmãozinho. Aquele anjo bondoso tranquilizou-os e até conseguiu que o pequenino adormecesse. Escutava inebriado aquela voz melodiosa que lhe respondia serenidade e esperança. Então pôde acalmar um pouco, recostando-se de encontro ao seu peito, fechando os olhos, sentindo pousar em si a sombra das suas asas delicadas.

16 comentários:

Fá menor disse...

Resolvi mudar de separador, para não cansar muito...
Oportunamente retomarei o separador "páginas soltas".

Cris disse...

Cansar, não cansa, mas continua a deixar-nos em suspense!!! Aiiii, e o resto? O que procuravam as crianças? Quem era o anjo? Tenho tantas respostas possíveis na cabeça! Mas eu gostava de saber a sua!
Beijinhos

Justine disse...

Vamos ter que sofrer muito mais para saber o resto da história??
Fico na expectativa...

P.S.: e mudar é bom, quando é para melhor:))

S. disse...

Ainda bem que na maior parte das vezes, aparece sempre um anjo bondoso nas vidas de quem mais precisa :)

Heduardo Kiesse disse...

Muda tudo. Muda. Mas nao me mudes de lugar - o teu coração!

E o final? Afinal vou ter mesmo que conter a curiosidade :-)

teu beijo, amiga!

Paulo disse...

"(...)Talvez uma luz divina o iluminasse(...)

Talvez.....

Paulo

Cruztáceo disse...

(Elogio destapado):
há quem guarde sonhos, aqui vi um de contos, de estorias, e outras memorias.

C Valente disse...

por aqui viajei, e vou voltar, gostei
Saudações amigas

Majo Dutra disse...

Deve ser um conto adorável! Gostei da narração impecável.
Boa semana, Fá. Beijos
~~~~~

By Me disse...

Fiquei curiosa com o desenrolar dos acontecimentos! Acredito em anjos!
Feliz semana outonal.
Beijinhos

Ane disse...

Ah... fiquei com pena das duas crianças e curiosa em saber da estória deles...por que estão andando sozinhos? Quem é o anjo salvador?

Ane/ De Outro Mundo

Porventura escrevo disse...

Um texto aparentemente com muito tempo, mas ainda bem atual

J.P. Alexander disse...

Genial relato el final me dejo con ganas de saber mas te mando un beso.

Parapeito disse...

Gosto , gosto muito.
Vou continuar a ler.
Abraço linda e brisas doces **

Ana Freire disse...

Um texto muito belo e comovente! Calculando que sejam os mesmos meninos... da publicação seguinte...
Sempre um prazer imenso, descobrir os seus trabalhos, Fá!
Um beijinho grande!
Ana

Flávio Cruz disse...

A tua poesia é como a tua fotografia, Fa: leve e atraente, cheia de luzes e cores. Por isso, volta e meia escolho ler os teus textos; em outras, fico com as fotos! Qualquer escolha me agrada, e muito! Meu abraço, boa semana.

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