Os olhos são de uma transparência igual à da água cristalina de um lago azul.
Lembro-me bem de me ter sido tirada esta foto que agora encontro na gaveta da cómoda.
Gosto de remexer nas gavetas. Estas têm sempre coisas interessantes que me atraem, que espicaçam a minha curiosidade. E esta sala, ao lado do quarto dos pais, é uma tentação.
Tinha vestida uma saia branca, às pregas. Tão linda! Ainda deve andar por aí nalguma gaveta. Vou ter de a procurar...
Ai... os sapatos!... recordo... já estavam apertados. Chorei porque não os queria calçar. Aleijavam-me - os pais pensam que sou sempre pequenina - mas fiquei bonita com eles.
Teria uns cinco anos. Os cabelos loiros, muito encaracolados. O padrinho até me pintou num quadro que está ao pé do rádio. Às vezes perco-me a olhar para ele, porque me prende a atenção o cabelo tão amarelo! Até me custa a acreditar que seja mesmo eu. Mas sou.
É que os olhos dos outros vêem-nos sempre de maneira diferente do que os nossos a nós próprios.
(Publicado em livro: Memória Alada, 2011)