26/03/2012

O último abraço


De cada vez que relembrava o último abraço, antes de lhe ter fugido, Luísa revivia toda a emoção desse momento. Aliás, a emoção era cada vez maior à medida que o tempo passava e as saudades apertavam. Revia a fofura do corpo de José Miguel colado ao seu; sentia os braços que a envolviam sem nada suspeitarem; o pescoço quentinho onde mergulhara a cara e deixara marcas de baton dos beijos desajeitados, sofridos, mas disfarçados; as costas que afagara de encontro a si num último adeus.
Na altura, sabia que a separação iria doer, no entanto, pensava que o tempo acabaria por curar tudo. Mas não. O tempo trazia a saudade, essa mágoa violenta que a oprimia, sufocava, deprimia. Doía-lhe o peito muitas das noites. Uma opressão constante, mesmo durante o sono, que lhe causava pesadelos. Eram as mãos do José Miguel que vinham para lhe arrancar o coração enquanto ela dormia. E ela debatia-se entre deixar que ele lho tirasse e morrer de amor, ou morrer na mesma de amor sem lho entregar.
Quando acordava, a dor era não só aperto no peito, mas, umas vezes, latejava-lhe no pescoço e corria-lhe ao ouvido esquerdo, outras vezes estendia-se ao braço do mesmo lado, e outras irradiava-lhe para as costas. Era como se tivesse sido erigida uma muralha fortificada ao redor do coração, para o impedir de sair ou alguém de entrar. Então, acendia a luz e suspirava fundo repetidas vezes, para ver se a dor passava. Tentava não pensar nele, mas quanto mais força fazia para o afastar do pensamento, mais ele se lhe intrometia. E voltava o último abraço, com toda a carga emocional e ainda mais alguma. E desejava outro abraço, um próximo abraço que os reconciliasse. Virava-se de bruços como se se deitasse sobre ele, imaginava-se a abraçá-lo de novo. E adormecia nesse abraço. A sussurrar-lhe amor e a pedir-lhe perdão.

15 comentários:

  1. Como escreves bonito, Fa?
    Leio-te e medito.
    Uma semana de paz!Beijos...

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  2. É assim a saudade....

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  3. Este é o dom de escrever.
    Lindo!
    Martha
    Beijos

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  4. A dor da ausência pode ser mesmo muito mais que a saudade.
    Gosto da tua narrativa, pois leo-te de um fôlego...
    Beijos, querida amiga.

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  5. Não há coisa melhor do que receber um abraço, mas o abraço de despedida de um amor que se vai, doi muito e provoca saudade, uma saudade sofrida. É que há saudades que até nos fazem sorrir, aquelas de momentos bons que passaram, porque o curso da vida assim o determinou, mas esta saudade de que falas aqui é terrivel e só o tempo a fará amenizar. Muito bem escrito,

    Fá. Parabéns Um beijinho e até breve.
    Emília

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  6. Um belo texto onde perpassa um apego desesperado a um amor que já teve o seu tempo...!
    Beijos,

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  7. Verdade. Muitas vezes, a saudade aumenta com o tempo. Boa semana, amiga!

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  8. A saudade é terrível! doí tanto...
    Bjs

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  9. Esta é uma saudade muito dolorosa e que só passa com o tempo !
    Uma boa Páscoa.

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  10. .

    .

    . e,,, porque adormecer no abraço é florir do húmus profundo . ainda que à superfície . na clemência do amor . ou do sentido de todos os afectos .

    .

    . uma Santa Páscoa .

    .

    . e,,, .

    .

    . um beijo meu .

    .

    .

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  11. É o tempo de renovar e recomeçar; renascer.

    Feliz Páscoa!

    Um beij

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  12. A dor da ausência...que eu conheço bem demais. Lindo.Bj

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  13. "...e adormecia nesse abraço..."
    Adormecer nos braços de quem se ama é sublime, é amar de verdade.
    Admiração e carinho por ti, amiga!!!

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  14. *
    ai, ai . . .
    nunca tenho cenas destas,
    sou um "desinfeliz" srsrsrsr.
    ,
    adormacidas conchinhas,
    ficam,
    *

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  15. Lindo demais Fá.
    Completamente envolvente!!

    Parabéns!

    Beijos!

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Truman Capote diz:
«Quando se trata de escrever,
acredito mais na tesoura do que na caneta.»...
Mas eu escrevo aqui por entre o imaginado e o sentido; e
«Entre meus rabiscos e minhas ideias há um mundo de sentimentos.» (Marcelle Melo)
.
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